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Câncer: é preciso prevenir (Artigo)

Todos acompanharam, com imensa tristeza, a luta do amado e idolatrado Pelé pela vida. A pergunta-chave: o câncer dele poderia ter sido evitado? É possível, para ele e milhões de pessoas, desde que participem de programas de prevenção e diagnóstico precoce, que permitem evitar o aparecimento ou, pelo menos, fazer o diagnóstico em fases não avançadas, o que aumenta as chances de cura, diminuindo os sofrimentos físico e emocional e - por que não? - os custos de tratamento.

Existem duas formas de prevenção: a primária, relacionada aos hábitos alimentares e de vida, que diminui o risco de aparecimento de alguns tipos de cân-ceres, e a secundária, que, assim como os diagnósticos precoces, é realizada através de exames direcionados, definidos pelos tipos de tumores e as características pessoais e familiares do indivíduo. A seguir, são apresentadas as bases de programas de prevenção e diagnóstico precoce para os tumores mais co-mumente diagnosticados.

Câncer de mama é o mais frequente em mulheres no Brasil e permite fazer diagnósticos precoces. Constituem o grupo de risco médio para esse tipo de câncer aquelas com mais de 40 anos, sendo definidas como de risco alto as que tiveram parentes de primeiro grau com a doença, as com mutações genéticas hereditárias ou as que tiveram biópsia prévia de nódulo de mama com atipias. Os programas consistem em mamo-grafia anual após os 40 anos para mulheres de risco médio, eventualmente complementada com ultrassonografia, e de mamografia complementada com ultrassonografia e ressonância magnética para as de risco alto, também em caráter anual. Diagnósticos precoces associam-se a índices de cura de mais de 90% dos casos.

Já o câncer de próstata é o tumor que mais compromete os homens no Brasil. A idade acima de 50 anos define as populações de risco médio, enquanto as populações de risco alto incluem indivíduos com história familiar do mesmo câncer ou, então, de câncer de mama, assim como afrodescen-dentes. Os programas de diagnóstico precoce baseiam-se na dosagem sanguínea de um marcador tumoral, o PSA, associada ao exame de toque retal a partir dos 50 anos para a população de risco médio e a partir dos 40 anos para a de alto risco. Diagnósticos precoces diminuem as mortes em 20%.

Câncer de cólon e reto é o terceiro mais frequente no País. Fazem parte do grupo de risco médio indivíduos com mais de 45 anos e de risco alto os que pertencem a famílias com sín-dromes genéticas, em especial poliposes e síndrome de Lynch, além daqueles com parentes de primeiro grau com esse tumor, os que tiveram previamente câncer ou pólipos adenomato-sos intestinais e com doenças inflamatórias intestinais. A co-lonoscopia é o exame de eleição para as pessoas com mais de 45 anos, sendo repetida a cada dez anos ou a intervalos menores, no caso de serem encontrados pólipos adenomatosos, que são precursores do câncer e podem ser retirados, praticamente ze-rando o risco de câncer até um próximo exame. Já para os grupos de alto risco, indica-se a co-lonoscopia mais precocemente, a partir de idades variáveis, com intervalos definidos para cada situação. Em grupos submetidos à colonoscopia, os índices de casos relatados é de 20% a 30% inferior ao esperado.

O quarto câncer de maior in cidência no Brasil é o de pulmão. São de risco médio para ele trabalhadores de metalúrgicas ou expostos ao amianto, bem como moradores de cidades com taxas elevadas de poluição atmosférica ou altas concentrações de gás radônio. São de risco alto adultos fumantes crônicos ou que pararam de fumar há menos de 15 anos. Para esse grupo, recomenda-se a to-mografia computadorizada de baixa dose anual, com o objetivo de se detectar tumores iniciais, o que ocorre em mais de 80% dos casos, aumentando a chance de cura e reduzindo em 20% as taxas de mortalidade. Evidentemente, a mais eficiente medida de prevenção do câncer de pulmão continua sendo evitar ou abandonar o tabagismo por completo.

No Brasil, atenção deve ser dada também aos tumores de colo uterino, decorrente de infecção por alguns grupos do pa-pilomavírus humano (HPV), transmitido através de relações sexuais, causando 17 mil casos anuais e 7 mil óbitos no Brasil. Atualmente, indica-se para sua prevenção que sejam vacinados meninos e meninas com mais de nove anos. No caso de vida sexual ativa, impõe-se o uso de preservativos, principalmente com parceiros instáveis. Adicionalmente, indica-se o exame anual de Papanicolaou, que per mite diagnosticar lesões pré-cancerosas ou câncer em fase inicial, garantindo assim quase 100% de probabilidade de cura.

Programas de prevenção e diagnóstico precoce para os tumores mais frequentes não são novidade, mas, infelizmente, não estão ao alcance de todos. No País, as restrições no setor público (SUS) decorrem essencialmente da falta de políticas públicas estruturadas que facilitem o acesso das populações de risco a exames de prevenção e diagnóstico precoce, além das crônicas limitações relacionadas com alocação de recursos financeiros, humanos e estruturais para esses programas. Por outro lado, é preciso reconhecer o baixo interesse de considerável parte da população, uma vez que sua preocupação maior é, de fato, pela sobrevivência. A análise do setor privado, por outro lado, mostra que nem todos os planos de saúde e seguros-saú-de estimulam seus associados a participar desses programas.

A ampla aplicação de programas de prevenção e diagnóstico precoce permite salvar vidas, evitar sofrimento e conter os gastos cada vez maiores com doenças avançadas. Com isso, temos certeza de que nosso Rei, do alto de sua eternidade, irá se sentir homenageado.